Rezo porque…

Por Becky S. Korich (advogada, escritora e colunista da Folha de São Paulo)

Estudei em uma escola britânica até os 10 anos e depois meus pais resolveram mudar para um colégio judaico. Na St. Pauls School havia uma reza matinal, das quais os judeus não participavam. Éramos poucos, ficávamos fora da sala mantando o tempo, como se rezar pertencesse a eles. Em casa, embora eu visse meu pai colocar Tefilin todos os dias, eu achava que mulheres estavam isentas de rezar, com exceção do Shemá.

Portanto, na minha cabeça, aquele lugar não era para mim. Mesmo assim, desde criança, eu tinha a minha própria forma de me comunicar com D’us. Quando entrei no Iavne, comecei a compreender que, sim, a reza também me pertencia. Queria entender as tefilot, nem todas me faziam sentido.

Mas fui fisgada quando traduzi, linha por linha, o Kriat Shemá al Hamitá e o Mode Ani. Não apenas decifrei as palavras, mas sobretudo entendi o significado de rezar, este sim, intraduzível. A ideia de dormir “limpos” – perdoando e pedindo perdão – e acordar agradecendo, nos dá uma dica do sentido da vida: o dever de tentar sempre fazer melhor e não se esquecer de agradecer e celebrar a vida. É um minuto que paramos para agradecer, que faz toda a diferença no dia. Isso foi transformador para mim.

Hoje não consigo começar o dia sem rezar – meu oxigênio espiritual – e a cada dia descubro novas camadas e novas formas de sentir, tão profunda que é a nossa tefilá. O Sidur é o mesmo, as palavras são as mesmas, mas cada vez elas tocam de forma diferente, porque nós é que estamos diferentes.

Quando rezamos, nos desconectamos de nós mesmos para nos conectar a algo maior. Reconhecemos a grandeza e a bondade de Hashem, viramos “sócios” Dele nas nossas escolhas e na construção do nosso destino.

Refletimos, meditamos e aquietamos a nossa mente. Repensamos e organizamos os nossos objetivos, o que ajuda o nosso corpo a cumpri-los. Não é à toa que o verbo Lehitpalel está na forma reflexiva: rezamos para D’us, mas somos nós que recebemos.